No seu período dourado, os anos 60, a gravadora Motown definia seus sucessos, corretamente, como "o som da América jovem". Hoje em dia, eles são os sons da nostalgia de astros britânicos do rock envelhecidos. Rod Stewart (no ano passado, com, Soulbook, um disco completamente sem soul), e agora Phil Collins gravaram tributos ao soul em forma de álbuns recriando antigos arranjos. As canções continuam certeiras, trabalhos de ourivesaria intricada tão indeléveis quanto as melhores joias do cancioneiro pop. Mas quem as canta faz muita diferença, e nem sempre diferença a favor.
Going Back, de Collins, que sai em 13 de setembro, foi gravado com integrantes da reverenciada banda de estúdio da Motown, os Funk Brothers, no acompanhamento. O músico britânico ofereceu uma amostra do disco no Roseland Ballroom, quarta-feira à noite, a abertura de uma temporada de três dias. "Foi com essa música que eu cresci, em Londres, quando era menino", disse Collins, 59, no palco. "Está bem, admito: eu já era adolescente".
O cenário e figurino privilegiavam o lado suave da Motown, com Collins de terno preto. A banda que o acompanhava tinha 18 músicos e vocalistas, entre os quais Bob Babbitt, no baixo, e Eddie Willis, na guitarra, ambos integrantes de formações do Funk Brothers nos anos 60. Os homens estavam de paletó púrpura, as mulheres usavam longos.
Os velhos sons se provaram instantaneamente reconhecíveis no desfile de sucessos promovido pela banda, entre os quais canções dos Impressions e Ronettes, que não gravavam pela Motown. Com Chester Thompson, que acompanha Collins há muito, na bateria e imitando o backbeat e o uso de pratos característico dos grandes hits da Motown, a banda incluía também metais, vibrafone e até um piccolo, para Tears of a Clown, de Smokey Robinson, ainda que as partes de cordas tenham sido cobertas por sintetizadores. Um aspecto estranho era a falta, na banda, de um dos recursos padrões da Motown, o bumbo duplo. Mas o som das guitarras, os vocais em modo gospel e os tamborins estavam perfeitamente corretos.
Já quanto a Collins... O afeto dele pelas canções é claramente genuíno. Como um curador, ele ocasionalmente as agrupava por tópico, como o abandono: Papa Was a Rolling Stone, do Temptations; Never Dreamed You'd Leave in Summer, de Stevie Wonder; Jimmy Mack, de Martha and the Vandellas; e You've Been Cheatin, do Impressions.
Mas Collins não era um jovem de Detroit ávido pelo sucesso ou um cantor criado nos corais de gospel, ou um músico do circuito de R&B. Estamos falando de um roqueiro britânico que é mais fã de soul que cantor de soul. A voz dele tem alcance emocional menor que dos astros da Motown, e o tom grave e melancólico que ele emprega torna as canções mais sérias do que são. Isso ocasionalmente ajuda a revelar a dor oculta em refrões familiares: o desespero de Nowhere to Run, de Martha and the Vandellas, o masoquismo de Marvin Gaye em Ain't That Peculiar.
Mas a voz dele não tem o tom de alegria e liberdade que fez da Motown um marco tão claro das esperanças que surgiram na metade dos anos 60. A versão de Collins para Heat Wave parece só morna, enquanto Going to a Go-Go parece falar de alguém que saiu para comprar alguma coisa. Enquanto isso, as questões desesperadas que um filho apresenta à mãe em Papa Was a Rolling Stone parecem mais um advogado tomando um depoimento.
Collins emprestou seu estilo à faixa título do disco, uma composição de Gerry Goffinn e Carole King gravada por Dusty Springfield e pelo Byrds como Goin' Back. Uma batida obscura e acordes de teclados a combinam mais ao passado de Collins, e as letras são menos adolescentes: "Estou voltando aos dias em que era jovem o bastante para saber a verdade". É um indício de que o disco poderia ter sido diferente, e não o sujeitaria a uma comparação tão dura com o melhor do catálogo da Motown.
Fonte: Terra e The New York Times (Jon Pareles)
Vamos esperar o lançamento! Sou fã do Collins e também cresci ouvindo os hits da Motown! abs Caio
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